quinta-feira, 23 de abril de 2009

O fenômeno da tribalização

A aula de sexta-feira, 17/4, girou em torno de uma questão central para a sociedade pós-moderna: com o advento de novas tecnologias da comunicação e a fusão do analógico com o digital, quais mudanças emergiram socialmente dentro deste contexto? O que de mais relevante pode-se obter desta questão é a tentativa de superar a discussão antigas mídias X novas mídias e, a partir disso, alcançar discussão maior, qual seja, por quê as mídias mais antigas, tipicamente de massa, são representadas pela relação "um-todos" e as novas tecnologias, tidas como digitais, inferem relação do tipo "todos-todos".

Para isso, como disse o professor por diversas vezes durante a aula, o conceito de tribos cunhado por Michel Maffesoli é de suma importância. Ele se torna relevante por permitir ter acesso à dimensão da mudança, em termos de individualização ou, como diz o próprio autor, de 'dessocialização', causada pela convivência com as novas tecnologias.

Quando se refere a mídias de massa, fala-se predominantemente de dois meios mais difundidos: a televisão e o rádio. Com eles, existe uma relação "um-todos" no sentido de que o veículo não permite interação com o que acontece, por assim dizer, no mundo dentro dele. Em contrapartida, apesar de não permitir 'interatividade', um veículo de massa socializa na medida em que torna possível que várias pessoas unam-se para participar daquele acontecimento que está sendo veiculado. O exemplo mais claro deste caso é a situação-clichê da família reunida em volta da televisão e, simultaneamente, várias famílias em outras casas também reunidas em volta de um televisor, todas numa relação, grosso modo, unidirecional. Afinal, embora possam todos estar assistindo a um mesmo programa, por exemplo, eles não conseguem se relacionar entre si, porque este tipo de veículo de comunicação não permite tal grau de interação. Por isso diz-se "um-todos". A mídia de massa socializa. Caso semelhante não acontece com novas tecnologias que surgem por volta de 1975.

A mídia tida como digital, que tem seu pontapé com a criação do PC - Personal Computer - ela dessocializa. A família reunida em volta do televisor ou do rádio dá espaço à individualização do mundo pós-moderno. Porém, como aponta Maffesoli, a individualização trazida pelas novas tecnologias criaram outro aspecto: o da tribalização. A partir do momento em que se tornou possível livrar-se das rédeas dos meios de massa e da consequente relação 'um-todos', o aparente isolamento que esta nova configuração poderia supor foi substituida pela personalização da relação com os meios de comunicação. As novas mídias dessocializam, sim, mas personalizam a relação e adicionam a ela a possibilidade de escolher o que fazer por interesses. A relação não é mais unidirecional. A relação de o que ouvir, de com quem conversar, de o que assistir agora é diretamente influenciada e escolhida por quem está em frente ao meio de comunicação. As novas tecnologias, as mídias digitais dessocializam na medida em que proporcionam que se viva mais, por assim dizer, de maneira personalizada. Dentro do processo de personalização das referências do cotidiano, encontra-se a origem do processo de tribalização, da reunião de pessoas por gostos e tendências comuns. A mídia digital, assim, individualiza, mas está bastante longe de promover o isolamento. Por mais contraditório que possa parecer, a individualização pós-moderna causa, em certo grau, a interação dos sujeitos contemporâneos.

Posto isto, o que se pode depreender desta que é questão central domundo pós-moderno é que enquanto a mídia de massa destribaliza, a mídia digital retribaliza por meio de uma relação todos-todos.

Porém, nesta individualização e dessocialização do homem pós-moderno, o sujeito contemporâneo é acometido pela situação de desamparo e não-pertencimento. Para preencher este espaço, o fenômeno da 'tribalização' surge como alternativa, talvez inconsciente, para dar conta dessa questão. A consequência é a superficialidade, nos mais diversos graus das relações sociais. Além disso, há uma certa sublimação idiossincrática, fazendo com que o indivíduo pós-moderno abra mão de sua própria essência para fazer parte da essência comum que compartilha com um grupo maior.

A tribalização aparece, portanto, como recurso para que, dentro de uma sociedade dessocializada, o sujeito não se sinta completamente deslocado. É cedo, contudo, para que sejam feitas avaliações definitivas a respeito do efeito que isso tem no psicológico individual dos membros de nossa sociedade.

O fenômeno da tribalização é a maneira para que, dentro desta mesma sociedade dessocializada, o sujeito não se perca e, principalmente, não se isole.

Bruno Mattos e Rafael Maia

5 comentários:

  1. "(...)há uma certa sublimação idiossincrática, fazendo com que o indivíduo pós-moderno abra mão de sua própria essência para fazer parte da essência comum que compartilha com um grupo maior." na minha opinião, essa é a afirmação que define as relações sociais contemporâneas firmadas por meio das novas formas de interação social. o sujeito pós-moderno é constituído por superficialidades na medida em que ele abre mão daquilo que ele de fato é para se incluir em um grupo maior, a fim de não se sentir deslocado num mundo cada vez mais fragmentado.

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  2. A releção todos-todos que as midias digitais proporcionam, tornou-se uma alternativa à relação um-todos das mídias de massa. Para mim, esse é um dos aspectos mais relevantes que o texto aponta. Outra ponto, o qual vem para desconstruir uma idéia de isolamento que de forma geral relacionamos ao mundo pós-moderno, é o fato de apesar de o indiviudo estar cada vez mais individualizado, no sentido de poder expressar suas ideias e gostos, ele não encontra-se isolado, pois por meio das tribos pode encontrar seus pares. No entanto, algumas caracteristicas dessas tribos, como a efemeridade que muitas dessas possuem, levam a certos questinomentos como o "efeito que isso tem no psicológico individual dos membros de nossa sociedade".

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  3. Acho interessante que os colegas coloquem a importância das tribos, quando escrevem que "O fenômeno da tribalização é a maneira para que, dentro desta mesma sociedade dessocializada, o sujeito não se perca e, principalmente, não se isole".
    As tribos realmente são uma identificação das pessoas, servindo até mesmo como 'etiquetas', como já foi dito no blog.

    Mas, cada dia mais, vemos pessoas pertencentes a diversas tribos, de diversas características. Então questiono: será que realmente temos vários pensamentos e idealizações (o que acredito) ou estamos apenas nos encaminhando para uma busca desenfreada de identidade?

    (Ângela Camana)

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  4. Achei o texto muito bom e gostei bastante da parte que fala da diferenciação entre a relação “um-todos” (veículo de massa) e “todos-todos” ( mídia digital).
    Concordo com o texto quando os colegas apontam que “as novas tecnologias, as mídias digitais dessocializam na medida em que proporcionam que se viva mais, por assim dizer, de maneira personalizada.” Ainda segundo os colegas, é nesse processo de personalização, de individualização, que encontra-se as raízes do processo de tribalização, já que se fez necessário a identificação das pessoas por gostos, aptidões, afazeres comuns.

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  5. Ótima resenha: bem articulada, clara e bastante interessante. Utilizo alguns pontos citados pelos colegas para tentar complementar o questionamento proposto pela Ângela. Concordo que possuímos vários pensamentos e idealizações, entretanto a busca desenfreada por uma identidade me parece mais fácil de ser constatada e compreendida na sociedade pós-moderna, a qual encara um processo de incorporação/inserção/reformulação de valores sociais (que são atribuídos, dentre outros fatores, ao advento das novas mídias digitais). Aliada a esta situação, observamos uma manifestação principalmente por parte dos jovens, cuja natureza e o perfil são mais acometidos pela sensação de não-pertencimento e isolamento. Por isso, esse grupo de indivíduos - especialmente - seria o responsável pela construção e pelo processo de tribalização visando a identificação pessoal; através das tecnologias digitais, os jovens têm a possibilidade de tirar proveito desse caráter de relação "todos-todos" com o intuito de formar e aprimorar uma participação mais ativa dentro de um círculo social.

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